julho 22, 2025

Após análise de imagens, réu é inocentado pelo Tribunal de Justiça de Goiás

TJ-GO entendeu que guarda mentiu e agrediu réu injustamente; caso reacende debate sobre abuso de autoridade

Em uma decisão que chamou atenção no meio jurídico goiano, a 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) absolveu Edson Garcia Cardoso Moreira no processo nº 0118749-46.2019.8.09.0175. O réu havia sido acusado pelos crimes de ameaça, corrupção ativa e resistência, mas acabou inocentado após a análise detalhada de imagens de câmeras de segurança, que desmentiram a versão apresentada por agentes da Guarda Civil Metropolitana (GCM) de Goiânia.

O episódio remonta a um incidente no qual Moreira teria, segundo a acusação inicial, ameaçado um guarda, tentado suborná-lo e resistido à prisão. Contudo, o vídeo que registrou toda a ocorrência mostrou uma realidade bastante diferente: ao contrário do que afirmavam os agentes, o réu foi agredido gratuitamente por um deles, sem haver qualquer ato de hostilidade prévio.

Durante o julgamento da apelação criminal, um dos desembargadores chegou a sugerir o envio de ofícios à Corregedoria da Guarda Civil para apuração da conduta dos agentes, levantando a possibilidade de que eles possam ter cometido falso testemunho e abuso de autoridade. A corte considerou que as provas produzidas, especialmente as imagens, eram claras ao demonstrar que Edson Garcia não ofereceu resistência nem tentou corromper os servidores.

A absolvição ocorreu sob o argumento de insuficiência de provas e ilegitimidade da abordagem, além da constatação de contradições nos depoimentos dos guardas civis. A defesa do réu destacou que, sem o registro audiovisual, seria praticamente impossível reverter o quadro, já que a palavra dos agentes públicos tende a ter um peso considerável nos tribunais.

Esse caso reforça a importância de gravações em abordagens policiais e o uso de câmeras corporais, uma prática cada vez mais defendida por especialistas em segurança pública e direitos humanos. “Se não fosse o vídeo, a narrativa oficial teria prevalecido”, afirmou um advogado criminalista ouvido pela reportagem, sob anonimato.

Além de absolver Moreira, o Tribunal sinalizou que pode haver desdobramentos administrativos e até criminais contra os agentes envolvidos. Embora nenhum procedimento disciplinar tenha sido confirmado até o momento, a recomendação para apuração já foi colocada na mesa, o que poderá levar a sindicâncias internas ou processos por abuso de autoridade.

O Ministério Público, autor da ação penal, ainda pode recorrer da decisão.

O julgamento reacende um debate antigo, mas sempre atual: como equilibrar a atuação das forças de segurança com o respeito aos direitos individuais e a garantia do devido processo legal. Em tempos de câmeras em todos os lugares, a transparência parece cada vez mais uma aliada da justiça — e não apenas um luxo tecnológico.

Fez sustentação oral o advogado Matheus Garcia Cardoso e Silva.

Quando o Estado erra: o impacto das falsas acusações e a difícil reparação

Absolvições por erro ou abuso policial expõem fragilidades do sistema de Justiça e deixam marcas duradouras nas vítimas

A absolvição de Edson Garcia Cardoso Moreira pelo TJ-GO levanta uma discussão que vai além do caso concreto: o impacto de falsas acusações e erros judiciais na vida das pessoas. Quando o Estado acusa injustamente um cidadão e, pior ainda, quando tal acusação nasce de um possível abuso policial, as consequências psicológicas, sociais e financeiras para a vítima podem ser devastadoras — mesmo após a absolvição.

Especialistas alertam que ser réu em um processo criminal deixa marcas que não se apagam facilmente. “A absolvição nem sempre limpa o nome da pessoa perante a sociedade”, afirma o advogado Marco Túlio Elias Alves, destacando que a simples acusação pode gerar demissão, abalo emocional, perda de laços sociais e até dificuldade para se recolocar no mercado de trabalho.

Além disso, o próprio sistema judicial brasileiro ainda enfrenta desafios para reparar essas situações. Diferente de outros países, o Brasil tem uma cultura judicial em que pedidos de indenização contra o Estado por erro ou abuso policial ainda são tratados de forma tímida. Muitas vítimas não sabem nem por onde começar a buscar reparação.

A Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019) trouxe avanços importantes ao prever punições a agentes públicos que agem fora dos limites legais. No entanto, como destacam juristas, o número de condenações com base nessa legislação ainda é irrisório, em parte pela dificuldade de se provar dolo ou má-fé por parte do agente.

Outro aspecto crucial que emerge desse debate é a necessidade urgente de modernização das polícias e do sistema de controle interno das corporações. O uso de câmeras corporais, por exemplo, já mostrou resultados positivos em estados como São Paulo e Santa Catarina, contribuindo tanto para coibir abusos quanto para proteger os próprios policiais de falsas alegações.

Para a sociedade, esses casos colocam em xeque a credibilidade das instituições e geram desconfiança. Em tempos de polarização e crise de legitimidade das autoridades, garantir que nenhum inocente seja condenado injustamente é mais do que um princípio jurídico: é uma necessidade democrática.

O caso de Moreira serve, portanto, como alerta e como símbolo. Alerta para a fragilidade do ser humano diante do poder estatal e símbolo de que, com as ferramentas corretas e o devido zelo judicial, ainda é possível fazer justiça — mesmo que tardiamente.

A busca por justiça, afinal, não é somente um direito individual: é o que sustenta a confiança no próprio Estado de Direito.

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