Por Guilherme Schneider e Gabriel Lopes
A Espanha, tradicionalmente reconhecida por sua forte presença educacional na Europa, deu um passo significativo para modernizar e regular o ensino superior no país. Em 7 de outubro de 2025, o governo espanhol aprovou o Real Decreto 905/2025, um conjunto de regras que altera profundamente as normas para a criação, reconhecimento e funcionamento das universidades, especialmente as que operam no modelo online.
As universidades online têm visto um crescimento notável nos últimos anos. De acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística da Espanha (INE), o número de alunos matriculados em cursos universitários online aumentou 56% desde 2020, um reflexo direto da pandemia de Covid-19, que forçou muitas instituições a migrarem para o ensino a distância. Estima-se que cerca de 20% dos estudantes universitários na Espanha estejam matriculados em programas de ensino online. Esse movimento foi acompanhado por um aumento no número de alunos internacionais, com aproximadamente 12% da população estudantil na Espanha vindo de fora do país, muitos buscando as facilidades de cursos digitais e flexíveis.
O Real Decreto 905/2025 surge, portanto, como uma resposta a esse crescimento acelerado e aos desafios que ele impôs, tanto em termos de qualidade quanto de governança. A medida visa garantir que as universidades online operem com os mesmos padrões de exigência das instituições presenciais, protegendo o prestígio do sistema educacional espanhol e assegurando a qualidade dos programas oferecidos, principalmente para estudantes internacionais.
O que muda na estrutura universitária
A norma estabelece novas condições para a criação de universidades, tornando obrigatória a avaliação prévia por órgãos como a ANECA (Agência Nacional de Avaliação da Qualidade e Acreditação). Se a avaliação for negativa, o pedido de criação ou o reconhecimento de uma universidade será imediatamente rejeitado. Além disso, uma exigência crucial é a chamada “massa crítica mínima”, que obriga as universidades a comprovarem ter, pelo menos, 4.500 alunos matriculados em programas oficiais dentro de um prazo determinado, uma medida que visa garantir a sustentabilidade e a relevância das instituições no cenário educacional.
Universidades online sob lupa
Para aquelas universidades com mais de 80% dos créditos em ensino virtual, a norma impõe um regime de controle mais rigoroso, que inclui exigências como:
- Corpo docente residente: Pelo menos 75% dos professores devem residir na Espanha ou na União Europeia, em regime de tempo integral.
- Oferta acadêmica mínima: As universidades precisarão oferecer pelo menos 10 graduações, 6 mestrados e 3 doutorados ativos.
- Estrutura financeira sólida: Comprovação de solvência e sustentabilidade operacional antes da autorização.
- Certificação de qualidade: Implantação obrigatória de um Sistema Interno de Garantia da Qualidade (SIGQ), conforme o RD 822/2021.
- Programas de investigação: Exigência de linhas de pesquisa permanentes e participação em editais competitivos.
Essas novas normas visam garantir que as universidades online não sejam apenas uma alternativa barata ao modelo presencial, mas instituições robustas, com presença local e comprometimento com a qualidade acadêmica e de pesquisa.
Os desafios para universidades menores
As exigências colocam enormes desafios para as universidades menores, que muitas vezes não têm a estrutura necessária para atender a tais critérios. O custo para manter um corpo docente residente, realizar pesquisa acadêmica e cumprir com os requisitos de oferta acadêmica e infraestrutura financeira pode ser proibitivo, especialmente para as instituições mais novas ou com foco puramente digital. Além disso, as restrições sobre docentes de tempo integral, que não poderão lecionar em universidades privadas enquanto estiverem em instituições públicas, dificultam ainda mais a contratação de profissionais altamente qualificados.
Prazo e consequências
As universidades já em operação terão de 3 a 5 anos para se adaptar às novas exigências. Caso não consigam cumprir os requisitos, poderão perder a autorização ou a renovação de reconhecimento. A ANECA terá o poder de realizar auditorias e até propor suspensões de atividades.
Impacto e leitura política
Embora o governo justifique o decreto como uma medida para proteger os estudantes e manter a credibilidade internacional da educação espanhola, críticos apontam que a medida favorece as grandes universidades já estabelecidas e pode dificultar a entrada de novas propostas inovadoras. Este novo marco regulatório tende a consolidar o domínio das instituições de maior porte, como UNIR, VIU e UDIMA, que já possuem uma infraestrutura robusta e modelos de ensino bem estabelecidos.
Um novo paradigma para as universidades online
Com o Real Decreto 905/2025, a Espanha estabelece um novo paradigma para o ensino online. O país sinaliza que, no futuro, as universidades digitais não serão mais sinônimo de operação simplificada ou de baixo custo, mas sim de estrutura sólida, pesquisa e presença local. Essa mudança implica um maior custo operacional e exigirá que as universidades online se alinhem aos padrões das instituições presenciais, colocando fim à era das universidades digitais com modelos de negócios mais flexíveis e menos exigentes.
A nova legislação marca um ponto de inflexão para o futuro do ensino superior online na Espanha, com o país assumindo uma posição de liderança na regulação da educação digital na Europa. No entanto, o sucesso desse modelo dependerá de como as universidades, especialmente as menores, conseguirão se adaptar a essas novas exigências sem comprometer a qualidade ou a acessibilidade para os estudantes.